Na primeira manhã do nosso primeiro dia de campo, tivemos uma revelação.
O celular despertou às seis horas. Fazia frio, mas não como na expedição do ano anterior, quando, de madrugada, o termômetro registrou a mínima de quatro graus no alto da Serra do Cipó. Estávamos novamente em abril, mês de poucas chuvas, de céu limpo e manhãs claras. Nos dias que se seguiriam, acordaríamos em meio a um nevoeiro que só iria se dissipar por volta das nove horas. Mas, naquela manhã, o ar estava claro o suficiente para termos uma visão ilustrativa de um processo que pode explicar em parte o fato da Serra do Espinhaço ser uma das regiões mais ricas em espécies endêmicas do mundo, principalmente de plantas.
O alojamento fica em um dos pontos mais altos da região, e da varanda temos uma vista ampla da serra do Espinhaço. Naquela manhã, havia um manto de nuvens cobrindo os vales e os sopés da serra, deixando à mostra apenas os topos dos morros. Era como um mar de ondas brancas e centenas de ilhas, a perder de vista.
A imagem ilustra a insularização dos topos de morros. Isso significa que a parte mais alta das montanhas tem características ambientais e biológicas diferentes da parte mais baixa. A região menos elevada funciona como uma matriz – ou um “mar” –, de onde emergem os topos de morros como ilhas. Por ter condições próprias, pode ser intransponível para alguns organismos em possíveis movimentos de dispersão. Como o isolamento reprodutivo de populações é um dos fatores que levam ao surgimento de novas espécies, o isolamento dos organismos nos topos de morros poderia explicar, em parte, a existência de tantas espécies, sobretudo vegetais, restritas a uma única serra ou a áreas bastante limitadas ou apenas aos pontos mais altos das montanhas.
O funcionamento dos topos de morros como ilhas é bastante estudado, e tem sido utilizado para explicar a ocorrência de endemismos em diversas localidades do mundo. Na Serra do Espinhaço, isso funcionaria? Provavelmente, sim, para plantas e outros organismos sésseis, com dificuldades de dispersão ou com grandes exigências quanto às condições do seu habitat. É bom deixar claro que as populações de espécies restritas aos topos de morros geralmente distam entre si de centenas de quilômetros, e as pequenas distâncias que observamos (foto) não seriam suficientes para levar ao isolamento das populações.
A visão que tivemos foi meramente ilustrativa. Mas foi uma boa visão para uma manhã de segunda-feira.
Por: Ana Carolina Neves (Instituto Biotrópicos – ananeves@biotropicos.org.br) / Foto: Jonathan Christopher Bausch Macedo (graduação em Ciências Biológicas, UFMG – jon-j-j-j@hotmail.com).
Anita!!!
Sempre bom ler seus textos! Eles ilustram viagens mil!
adorei, como sempre!
Beijocas saudosas!!
O Espinhaço é realmente um infinito incrível… Intermináveis paisagens de tirar o fôlego! Ler esse diário me fez relembrar tantas expedições que fiz explorando os campos rupestres desta região coletando abelhas ( > de 500 espécies). Espero, em breve, também contribuir para este Diário de Campo, com minhas experiências de andarilho nas tantas serras do Espinhaço! Parabéns Aninha, é um privilégio ter você no nosso grupo Biotrópicos. Abração,
Alex.
Ei Aninha,
Muito bacana o blog!
Fiquei lembrando das viagens pro campo…
O texto tá ótimo!
Bons posts pra você!
Bjo, Fernando
Ana, parabéns pela iniciativa, achei excelente a idéia! Tenho certeza que vai ter muito sucesso! Abraço.
Ana, que legal!
Essa coisa de falar da ciência é mesmo contar histórias!
Virei sempre ler dessas por aqui, sendo macias como essa é!
bejos
Carol,
seu texto é uma delícia (como é que você já não tem blog há mais tempo, menina?) e a foto do Jonathan é de cair o queixo – que coisa mais linda!
Muito sucesso pro Diários de Campo, vou falar dele pra todo mundo – fofoca para fins pacíficos… 🙂
E que foto mais maravilhosa essa do cabeçalho, hein!
bjk
Mônica
Crônicas Urbanas